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"Nasci pela Ingazeiras/ Criado no ôco do mundo./ Meus sonhos descendo ladeiras,/ Varando cancelas,/Abrindo porteiras./ Sem ter o espanto da morte/ Nem do ronco do trovão,/ O sul, a sorte, a estrada me seduz./ É ouro, é pó, é ouro em pó que reluz/ É ouro em pó, é ouro em pó./ É ouro em pó que reluz:/ O sul, a sorte, a estrada me seduz"

- Ednardo



segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

madrugada

I

Hoje, resolvi caminhar pelas ruas
Só.

Vesti uma camisa qualquer com qualquer calça;
Mas não eram quaisquer retalhos,
Eram pedaços de sonho,
Sonho inteiro,
Que cobriam os rasgões da roupa.
Cubro meus pés com tênis,
Como se fosse sair.
E saio.

É madrugada e faz frio,
O que é um milagre por si
Só.

A rua não cabe na rua quando a noite é maior:
Se não passam carros, motos, gente,
Que diferença há entre a calçada e a rua?
Não falo das árvores, da pele do chão, das paredes,
Das listras...
Falo de falarem os veículos e os pés.
Mas se passo, se estou na rua
(outra rua, sentido maior. Rua: o que não é casa),
A rua é rua, a calçada é calçada.
Eu tenho o poder de definir as coisas,
De dizer “É” –
Mesmo alta a madrugada;

Mas também quero desdefinir...
Quero dizer que o céu não é o céu:
É um quadro onde desenho com os dedos,
Ou uma noite estrelada de Van Gogh.
Já disse também que o céu é o corpo dela
De sinais brilhando como estrelas.
O céu não é o céu: são as bochechas, olhos e boca
Do universo.
Mas como pode o céu cheirar a saudade?
Saudade da infância no sítio,
Saudade de tu e de mim em janelas à noite, celular.
Isso tudo me faz pensar que o universo
Tem também um nariz: o meu, hoje.

E, pensando, nem me dei conta que estive parado.
Estive parado numa calçada. Latem cães.
Tremem de frio estrelas.

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